matéria flutuante, 2023

Há algum tempo venho trabalhando com materialidades que possam saltar da imagem — como se estivessem por um fio, prestes a se desprender, a escapar.

Como acontece na gente, nos acontecimentos cotidianos, no dentro-fora dos afetos e atravessamentos, há sempre algo que parece se soltar, se perder, escapar.
Imagino — e na imaginação, por exemplo, é como quando parece que estamos chocando um ovo no peito: vemos o ovo, vemos o peito.

Nesta série, matéria flutuante, utilizo o plástico, a sacola — objetos do cotidiano que descartamos quase automaticamente. cujo destino é o lixo.
O abandono me interessa. Acolher o abandono das coisas. Ver o que resta. O que pode brotar através das possibilidades que a matéria apresenta.
Às vezes, é pouco. Pequeno.
Um pedacinho de plástico.
O resto de um fio encontrado na rua, ainda brilhando.
Miudezas.

O que pode dentro das possibilidades da realidade, da precariedade, do pequeno quarto de trabalho. O que disponho como ferramenta — além das mãos — e algum conhecimento.
Penso:
Tatear essa matéria.
Trazê-la para outras superfícies.
Pra onde ela me leva?
O que me mostra?
O que me diz, nesses 15 x 21 cm (na maioria das vezes), transformando a atmosfera do ato fotográfico primeiro — o gesto, o corpo, o acontecimento?